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Crônicas | A Cidade Nunca Morre #3

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Eu analisava os contornos de um prédio quando constatei que a cidade era extensa demais dentre nós. Desde o menino tocando pandeiro, o rockeiro que atravessa a avenida, a moça que compra na banca de jornais. O prédio tinha uma arte que contemplava elementos culturais do estado, bem em sua torre lateral. Diferentes experiências na cidade me fazem estar em comunidade, com os moradores, ocupando espaços, é uma coisa que nenhum dinheiro no mundo é capaz de pagar. Ser uma repórter/editora de moda e sociedade, pra mim, é quase um título nulo, já que considero que um reconhecimento profissional não é nada se não tivermos caráter. E eu tenho cárater o suficiente pra dizer: eu amo a cidade em si. Eu gosto de olhar os mercados da Vila Rubim. As comunidades de Vitória e Vila Velha são muito mais do que estética. Saber que em cada metro quadrado, se tem uma história, é uma explosão em minha mente. Há coisas que o dinheiro não compra — nem o preço da passagem — eu ouvi um menino tocar pandeiro. Não quero romantizar isso, já que vivemos em uma cidade, que a cada parada de ônibus, entram pessoas desesperadas por uma renda. Mas é importante lembrar, que a cidade que deve ser contada, também tem as minorias. Ficar longe da cidade que é contada nos jornais, nos faz participar da vida e estar aberto a entender os prós e os contras, mas amá-los — não no sentido romântico, mas cuidar de uma cidade e fazer a diferença, nela. É surpreendente ver gente que vive a cidade nobre, e que não conhece a alegria de comer um pastel na pracinha, que enfim, não reconhece os seus privilégios. Tenho uma ideia de ataque à ficção. Gosto de sentir o sabor do real, da declaração de amor, de sentir um abraço na alma, o cinzento dos prédios, o mar quase turquesa, os alagamentos em dia de chuva, quem está atravessando a faixa, os navios aguardando a ancoragem, os urubus voando no alto, viver a rua, as crianças correndo pelo terminal, o sol que se põe laranja, o bebê conversando com a avó, a voz do menino que toca pandeiro, os rostos das pessoas, do imaginário de como deve ser a vida delas, o sensível ao grotesco. Como não sentir tudo isso? Como não se revoltar? Como não fazer às pazes e amar ao mesmo tempo? Minhas viagens de ônibus pela Grande Vitória e as histórias da minha janela têm me feito enxergar além da luminescência capixaba. Os vislumbres diários, essas coisas platônicas, como é lindo estar junto, delirando pra sobreviver, curando tudo com amor, multiplicidades, a cidade viva, longe da burguesia, é mais interessante e mais revoltante do que se possa imaginar. Se não revolta, não há política, sem política, sem cidade. Sem o amor sincero, não a vida. e sem a vida, não há liberdade. Liberdade de ir e vir, vendo as montanhas que se encaixam perfeitamente no território de Cariacica, e do outro lado, a Terceira Ponte se aproximando a cada passo. Um momento inesquecível é ver a cidade dormir e acordar, todos os dias, em horários definidos — ora enquanto o silêncio reina, ora a cacofonia dos veículos é quase estressante. não há como viver sem a experiência social. Viver numa bolha é a tal falta de caráter que eu abomino ter, que tem comprimido “bom dias” , “boa tardes” , e “boa noites”, prendido sorrisos, matado sentimentos. Mas é sentir a cidade na pele, nua e crua, me abastece a sonhar.






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Conheça Louize Lima - Apesar de ter nascido na capital, sempre morou em Vila Velha. "Me mudei para Minas Gerais em 2014, e nesse momento percebi que esse grande sentimento de pertencimento à Grande Vitória não era algo fútil. Assim, comecei a escrever o que sentia. Logo, voltei para o ES em meados do ano passado e reuni tudo que eu tinha escrito, durante o período que morei fora e publiquei no Medium — ascendendo o meu amor por crônicas da cidade. Aos 19 anos, ser graduanda em Letras pelo Instituto Federal do Espírito Santo e ter toda essa bagagem profissional, tem colaborado cada vez mais para que eu exerça o amor que sinto pela Grande Vitória".

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